Novos desenhos de segurança e defesa: o caso da Finlândia
(In English: here )
Muitas coisas aconteceram em pouco mais de um ano. No meu país natal, a Finlândia, foi destruído um alicerce básico da política de segurança. A Finlândia já não é um país neutro, nem sequer um país não alinhado, mas um membro da NATO. Esta é uma situação que muito poucos finlandeses teriam pensado ser possível há apenas dois anos, mas que agora é uma realidade e um facto evidente que ninguém põe em causa.
A Finlândia e Portugal são dois pequenos países situados em extremos opostos do continente europeu. Somos ambos vizinhos de um país maior. Somos ambos irmãos mais pequenos desse vizinho maior. Mas num aspeto somos muito diferentes.
Enquanto Portugal tem o Atlântico ao longo da sua fronteira, a Finlândia tem a Rússia. Isso teve um impacto profundo no nosso sentimento de segurança e na nossa abordagem à política externa.
Quando, há cerca de quinze anos, perguntaram ao antigo Ministro da Defesa finlandês, Häkämies, qual era o maior desafio da Finlândia em termos de segurança, ele respondeu que havia três desafios:
”A Rússia, a Rússia e a Rússia”.
Há quinze anos, esta declaração deu que falar. Chegou mesmo a suscitar algumas críticas, especialmente do lado esquerdo do espetro político finlandês.
Hoje em dia, é vista como uma franca exposição dos factos. É esse o nosso desafio e, no que respeita à segurança, a nossa única ameaça militar.
Irei falar sobre a situação atual, mas para chegar a esse ponto quero recuar um pouco na história. Falarei sobre os antecedentes do desenvolvimento da Finlândia, como se formou o nosso sentimento de segurança, que factos e acontecimentos históricos conduziram à nossa abordagem. Como nos libertámos gradualmente do trauma pós-guerra, como a Finlândia se aproximou do Ocidente – porque tem sido um processo lento e não totalmente fácil.
Falarei sobre o nosso conceito de segurança e sobre como difere das soluções de segurança de outros países. Falarei sobre o pensamento por trás dele.
E, no final, abordarei as razões que acabaram por levar a Finlândia e, espero, também a Suécia a se tornarem membros da NATO. O que significa a guerra na Ucrânia para a Europa e para o mundo e como desafia a visão que temos da nossa posição no mundo. Como deve ser encarada a segurança na Europa, qual é a nossa maior ameaça e como podemos sair desta crise com um melhor conhecimento da realidade.
Porque verdade seja dita, caros amigos, nós, europeus, fomos mais do que ingénuos durante demasiado tempo.
Há momentos que definem uma nação. No caso da Finlândia, é fácil perceber qual foi esse momento.
Falarei da guerra na Ucrânia mais adiante, mas há razões para a guerra ter tido uma tão grande repercussão na população finlandesa.
A trinta de novembro de mil novecentos e trinta e nove, a Finlândia foi atacada pela União Soviética, numa guerra que se previa muito curta e rápida. Shostakovich já havia composto uma peça musical para ser apresentada em Helsínquia alguns dias após o ataque. Estaline pensou que o Exército Vermelho poderia marchar sem contestação até à nossa capital e que os soviéticos seriam recebidos como libertadores e amigos.
Tal como Putin pensou que seria bem recebido em Kiev após apenas três dias de combates.
Não foi esse o acolhimento que teve.
A Finlândia lutou durante cento e cinco dias na chamada Guerra de Inverno. Foi o único país que lutou contra os soviéticos e que não foi invadido e conquistado.
A Finlândia teve de ceder algum território, mas as perdas do lado soviético foram tão dramáticas que Estaline aceitou celebrar um acordo de paz com os finlandeses.
A Guerra de Inverno ensinou-nos, a nós, finlandeses, que a Rússia é uma ameaça, que não se pode confiar nela, que tem ambições imperiais, e que temos – e somos capazes – de nos defender. As alianças são uma coisa boa, mas, no fim de contas, cada país tem de cuidar de si próprio. É uma questão de economia, de defesa, de produção, de educação e, acima de tudo, de cooperação.
Essa lição tem sido a base do pensamento finlandês em matéria de segurança desde então.
Depois da guerra, a Finlândia passou por momentos muito difíceis. Éramos independentes, mas estávamos claramente sob influência soviética. Havia uma necessidade pragmática de manter boas relações com o nosso vizinho de Leste, o que não era totalmente desprovido de benefícios. A Finlândia tinha muitas relações comerciais bilaterais com a União Soviética, mas, por outro lado, a nossa liberdade de circulação na esfera internacional era limitada.
Balançávamos entre o Ocidente e o Leste, sendo lentamente empurrados para o lado ocidental.
Quando a NATO foi formada em mil novecentos e quarenta e nove, ficou claro que a Finlândia não se tornaria membro. Mas a Suécia também não. A Suécia ficou de fora da NATO devido à sua longa história de neutralidade, mas também por lealdade para com a Finlândia. Se tivéssemos ficado sozinhos ao lado do urso soviético, a história poderia ter tido um desfecho diferente.
Mas, lentamente, fomos avançando em direção ao ocidente. Em mil novecentos e cinquenta e cinco, a Finlândia tornou-se membro do Conselho Nórdico. Em mil novecentos e sessenta e um, a Finlândia celebrou um acordo de comércio livre com a EFTA. Em mil novecentos e setenta e três, assinámos um acordo de comércio livre com a Comunidade Europeia e, em mil novecentos e oitenta e seis, aderimos à EFTA.
Tudo isto aconteceu numa altura em que a abordagem finlandesa era vista por muitos como excessivamente pragmática. Cunhou-se o termo ”finlandisierung”, ”finlandização”.
Equilibrámo-nos por uma questão de sobrevivência, tentando manter relações amigáveis com a União Soviética e, ao mesmo tempo, evoluir para um país ocidental orientado para o mercado.
Lembro-me claramente de como nos sentíamos um pouco envergonhados com o epíteto de ”finlandização”. Quando vim para Angra, em mil novecentos e oitenta e sete, com dezassete anos, já tinha pensado muito sobre o assunto e tinha todas as respostas na ponta da língua para o caso de alguém me perguntar.
Bem, ninguém perguntou.
E a era da finlandização terminou mais cedo do que muitos pensavam.
O colapso da União Soviética mudou a História. Não acabou com ela, como pensava Francis Fukuyama no seu livro de mil novecentos e noventa e dois, mas mudou-a.
E isso também levou a Finlândia a dar os derradeiros passos necessários à sua plena integração no contexto da Europa Ocidental.
Tornámo-nos membros da União Europeia em mil novecentos e noventa e cinco, após um referendo nacional bastante renhido. Para mim, para muitos finlandeses, foi um grande passo em termos emocionais. Desde então, a Finlândia tem sido um dos países mais favoráveis à União Europeia dentro da própria União. Apesar de, durante uma grande parte da nossa adesão, termos sido um contribuinte líquido do ponto de vista económico.
Mas voltemos à segurança. Foram esses acontecimentos que moldaram o nosso conceito de segurança. Confiar em si próprio, estar pronto, estar preparado.
A Finlândia tem uma população de cinco vírgula cinco milhões de habitantes. Temos um exército de duzentos e setenta mil soldados em tempo de guerra e uma reserva de quase um milhão. Temos a maior artilharia da Europa. As nossas forças armadas são mais poderosas do que as da maioria dos países europeus.
E isto não é de agora. O serviço militar obrigatório foi sempre uma constante durante toda a nossa existência. A defesa nacional é uma tarefa nacional. Pode mesmo dizer-se que é uma missão.
Espera-se que todos os rapazes – e muitas raparigas – cumpram serviço militar. E a maioria dos rapazes cumpre. E não é apenas uma forma de ensinar competências militares ou de manter a prontidão militar, mas também um modo de criar unidade nacional.
Costumo dizer que o superpoder finlandês é a confiança. A confiança na sociedade. As coisas são bastante fáceis na Finlândia. Raramente se precisa de muita papelada, a palavra dada tem muito peso.
E creio que o serviço militar partilhado tem muito que ver com isso.
Quando um grupo inteiro de jovens passa por uma experiência comum, o serviço militar, cria-se um laço que gera confiança. E essa confiança, mais tarde, é transportada para a vida e para a sociedade e facilita a concordância em muitas coisas.
Então a história chegou ao fim com a Guerra Fria? Não.
Enquanto a maioria dos Estados europeus implementou transformações fundamentais nas suas forças armadas no rescaldo da Guerra Fria – passando de capacidades de combate em grande escala a pequenas forças totalmente voluntárias – a abordagem finlandesa à defesa pouco mudou. Estando situada junto a uma grande potência militar, a Rússia, a lógica da nossa defesa militar não se alterou no início da década de noventa, nem sequer quando a União Soviética entrou em colapso. Embora o enquadramento ocidental da segurança internacional tenha mudado consideravelmente nos anos noventa e seguintes, a Finlândia continuou a adquirir tanques de batalha, sistemas de lançamento múltiplo de foguetes, caças intercetores, sistemas de mísseis terrestres de defesa aérea, e outros sistemas militares necessários a uma abordagem defensiva de “grande guerra”.
Preparámo-nos para uma situação que a maioria dos países pensou que nunca iria acontecer. Preparámo-nos para a situação que a Ucrânia está a enfrentar agora – e comprámos tanques que os Países Baixos pensavam já não precisar ou canhões de que a Alemanha se queria livrar.
No meio da maior crise económica que a Finlândia alguma vez teve, a depressão do início dos anos noventa, comprámos uma quantidade significativa de F/A dezoito aos Estados Unidos. Fomos ridicularizados por vivermos no velho mundo, mas pensámos que poderiam vir a ser úteis um dia. Ao mesmo tempo que esperávamos que não viessem a sê-lo.
O princípio orientador no domínio da defesa militar tem sido o de que não é possível inverter a marcha rapidamente. A transformação militar demora cerca de trinta anos. Livrar-se das capacidades existentes é possível em poucos anos – construir novas capacidades demora anos, décadas. Isto é algo de que vários países já se aperceberam.
Atualmente, tal como durante a Guerra Fria, o sistema de defesa finlandês baseia-se no princípio de que ”nem o maior dos ursos come um porco-espinho”. Não se trata de igualar o nível de capacidade militar da vizinhança da Finlândia; trata-se de tornar qualquer potencial operação militar contra a Finlândia tão dispendiosa que nem sequer tentá-la seja uma opção atrativa. O aumento da cooperação internacional no domínio da defesa – com a Suécia, por exemplo – apoia esta lógica.
Há pouco falei de confiança. Um aspeto essencial de uma capacidade de defesa é a vontade que os cidadãos têm de defender o país. São envidados todos os esforços para que essa vontade se mantenha elevada. Mais de oitenta por cento da população adulta concorda que a Finlândia deve ser defendida militarmente contra um ataque em todas as situações, mesmo naquelas em que o sucesso não é garantido. É uma das percentagens mais elevadas da Europa. Penso que só é ultrapassada pela da Ucrânia.
Noutros países, o resultado é significativamente inferior. Como concluiu um inquérito global da Gallup Internacional em dois mil e quinze, ”sessenta e um por cento dos inquiridos em sessenta e quatro países estariam dispostos a lutar pelo seu país, enquanto vinte e sete por cento não estariam. No entanto, existem variações significativas por região. A vontade de lutar é mais baixa na Europa Ocidental, situando-se nos vinte e cinco por cento”.
Os números são elevados não porque nós, finlandeses, não saibamos o que é a defesa nacional e o que pode significar na prática, mas porque sabemos.
O serviço militar obrigatório é também um fator importante que intensifica a força da sociedade finlandesa. Para além de fornecer um conjunto de recursos humanos necessário às forças de defesa em tempo de guerra, o serviço militar obrigatório fortalece toda a sociedade e a sua capacidade de resistência em situações de crise. Ter uma finalidade na sociedade – e estar pronto a sacrificar tempo e esforço – é um elemento unificador fundamental. Praticamente todos os agregados familiares na Finlândia têm um ou vários cidadãos-soldados no seu seio. Eu tenho cinco filhos – quatro filhos e uma filha. O meu filho do meio, Alvar, acabou de sair do serviço militar e vai continuar com a sua vida normal de estudante de economia.
Eu sou um oficial na reserva. A maioria dos finlandeses tem unidades designadas em tempo de guerra e tarefas designadas em caso de crise.
Mas a segurança não é apenas uma questão militar. A doutrina de segurança finlandesa articula-se em torno de um conceito chamado modelo de segurança abrangente. É construído em torno da defesa militar, mas sobretudo em torno do conceito de que toda a sociedade tem uma tarefa em caso de crise.
Temos cursos de defesa nacional que são frequentados pela maioria dos executivos de topo e funcionários públicos. Isto significa que tanto as empresas como a sociedade civil sabem o que contribui para a segurança. Todos têm uma tarefa. Todos sabem o que podem e devem fazer em caso de crise.
A coesão social também tem um impacto. As pessoas instruídas, com emprego e possibilidades de uma vida decente, têm poucos ou nenhuns incentivos para um comportamento antissocial. Isto é particularmente verdade quando o bem-estar absoluto das pessoas está relacionado com um sentido de justiça e com a justa distribuição da riqueza e do bem-estar na sociedade. É por isso que a igualdade de oportunidades não pode ser negligenciada.
Quando sentimos que temos um lugar na sociedade, queremos contribuir. Quando sentimos que recebemos algo, queremos dar. Esta é também a essência do modelo finlandês – ou nórdico.
E, especialmente hoje em dia, quando os ataques podem surgir de várias formas, quando a guerra híbrida pode prejudicar-nos tanto como a guerra convencional, a educação é fundamental.
Porque a Rússia tem programas alargados de guerra de informação. Sabemos o que fizeram nas eleições de dois mil e dezasseis nos Estados Unidos. Sabemos o que fizeram no referendo do Brexit. Muitos partidos europeus radicais de direita ou de esquerda têm laços obscuros com a Rússia. Perante esta realidade, a educação é fundamental e, especialmente, a literacia mediática.
Mesmo que a Finlândia tenha sido alvo de operações de informação alargadas por parte da Rússia, o impacto foi, na melhor das hipóteses, modesto. Uma população instruída sabe distinguir o verdadeiro do falso e é mais resistente a ataques híbridos.
Mas voltemos à atualidade.
Muitos de nós pensámos que a Rússia era um país mudado. A boa vontade que se alastrou pela Rússia nos anos noventa e ainda durante este milénio foi significativa. Sim, talvez tenhamos tomado as coisas como garantidas, e sim, talvez toda as consultas de que o governo russo usufruiu nos anos noventa não tenham sido de primeira água, mas mesmo assim as coisas poderiam ter seguido um rumo muito diferente.
Na sua tentativa de assegurar o poder no final dos anos noventa, o círculo em torno de Ieltsin cometeu alguns erros críticos que minaram efetivamente o sistema político russo.
E, acima de tudo, subestimaram Putin e pensaram que ele era um fantoche que podiam manipular. Obviamente não era.
Putin não é um democrata. É um imperialista nostálgico que não se coíbe de utilizar até as medidas mais duras para atingir os seus objetivos.
Não hesitou em arrasar Grozny. Não hesitou em invadir a Geórgia. Não hesitou em remover os seus opositores do terreno, quer se chamem Lebedev, Politkovskaya ou Navalny. Não hesitou em invadir a Crimeia, em mentir na televisão internacional ou nacional, e agora não hesitou em invadir a Ucrânia, causando assim a maior ameaça à segurança internacional desde a segunda guerra mundial.
Para nós, é difícil ver a fundamentação lógica por detrás disso. Para um imperialista nostálgico, a fundamentação lógica é provavelmente muito simples. Que mais causou ele?
A invasão da Ucrânia conduziu a muitas coisas. Foi uma guerra que, supostamente, foi motivada pela necessidade de impedir os países de aderirem à NATO.
Até à data, teve vários efeitos, nenhum dos quais, comprovadamente, era pretendido. Destruiu, muito provavelmente, o futuro económico da Rússia por várias décadas. Fez cair a pique o estatuto internacional do país. Quando o único apoio na ONU vem da Bielorrússia, da Eritreia, da Síria, e da Coreia do Norte, a Russia tem um problema.
A guerra fez com que dois países não alinhados, a Finlândia e a Suécia, se tornassem membros da NATO. Bem, a Suécia ainda está à espera que Erdogan e Orban se organizem, mas acabará por entrar.
Em vez de impedir os países de aderirem à NATO, Putin mais do que duplicou a fronteira da Rússia com a NATO. É um feito e tanto.
Porque, na verdade, a NATO não estava no radar da Finlândia. De facto, tentámos evitar um debate sobre a NATO. Preferimos falar da cooperação nórdica, por ser mais fácil. Preferimos falar da componente de defesa da União Europeia, pois parecia mais amigável.
Devido à nossa história, a NATO era um assunto mais difícil.
O meu partido foi um de apenas dois, num total de nove, no parlamento, que se mostraram favoráveis a uma adesão. Agora, todos os partidos a apoiam.
Durante décadas, o apoio rondou os vinte por cento. Quando a Rússia invadiu a Geórgia, não se alterou. Quando a Rússia invadiu a Crimeia, não se alterou. Quando, há dois anos, eu próprio apelei a um processo de adesão, já que era evidente que a Rússia estava a planear algo, não se alterou.
Mas quando os tanques russos começaram a marchar em direção a Kiev, os finlandeses fartaram-se. O apoio ultrapassou imediatamente os cinquenta por cento e está agora nos oitenta por cento.
Nós, os finlandeses, somos pessoas pragmáticas. Podemos ser teimosos, mas quando a situação muda, podemos mudar de ideias. Durante demasiado tempo, pensámos que era possível negociar com os russos. Quando Putin mostrou a sua verdadeira face ou, para citar o nosso Presidente Niinistö, ”quando lhe caiu a máscara”, adotámos essa realidade. E o resto é história. No Parlamento, cento e oitenta e sete deputados votaram a favor da adesão e apenas seis votaram contra. Trata-se de uma enorme maioria.
Naturalmente, era extremamente importante que a Suécia também aderisse à NATO. Isso levou a um intenso vaivém entre a Suécia e a Finlândia em março e abril de dois mil e vinte e dois. Nós, finlandeses, tivemos de convencer a Suécia a alterar a sua posição. E não foi tarefa fácil.
Para a Suécia, a neutralidade faz parte integrante da sua identidade nacional. Têm os ABBA, o IKEA, as almôndegas e a neutralidade. Não foi fácil abandonar essa identidade e o primeiro-ministro sueco Andersson mostrou-se muito relutante no início.
Tage Erlander, que era primeiro-ministro da Suécia quando a NATO foi formada, disse nas suas memórias que a Suécia ficou de fora da NATO, de certa forma, por solidariedade para com a Finlândia. Agora, nós, finlandeses, tivemos, por solidariedade, de empurrar suavemente a Suécia para a NATO.
E conseguimos, o que me deixa muito feliz.
Com a Finlândia e a Suécia como membros, a NATO ganha algumas capacidades significativas. Estes países são democracias fortes, duas das potências militares mais capazes da Europa e têm indústrias de defesa consideráveis.
Nenhum deles é um fardo e ambos podem assumir as suas responsabilidades defensivas.
Tendo isso em consideração, é triste constatar até que ponto o processo de ratificação foi objeto de um jogo político. Uma aliança que depende essencialmente do ”princípio dos três mosqueteiros”, um por todos, todos por um, e que não consegue ratificar rapidamente a adesão de dois candidatos que a reforçam de forma inequívoca, tem um problema.
Por isso, esperemos que a promessa que Erdogan fez em Vilnius há algumas semanas se mantenha.
Mas, entretanto, a guerra continua. E expôs muitos problemas que, até agora, nos tínhamos recusado a ver.
A Europa tem estado demasiado dependente dos Estados Unidos para a sua defesa. Desmantelámos a nossa indústria de defesa e a nossa prontidão. A maioria dos países desmantelou os seus sistemas de serviço militar obrigatório e virou-se para forças voluntárias que são pequenas e mais adequadas a tarefas limitadas do que à defesa da Europa.
Durante este ano, a Europa tem ajudado a Ucrânia de muitas formas. Também militarmente. Foi também uma revelação, no sentido negativo, o facto de não dispormos de stocks adequados. Temos obuses, mas não temos munições suficientes. Podemos ter aviões, mas poucos têm tanques.
Fui um dos dois deputados finlandeses que lançaram a iniciativa europeia “Leopard”, que levou vários países europeus a enviar tanques Leopard um e dois para a Ucrânia. Embora tenhamos um número abundante destes tanques modernos na Europa, apenas alguns estão em condições de ser utilizados em caso de crise.
Temos estado terrivelmente mal preparados.
Atualmente, a NATO cobre uma grande parte da União Europeia. Não vale a pena construir estruturas paralelas. Mas mesmo que tenhamos a NATO, cada país tem de suportar o seu próprio peso. A meu ver, há muito poucas coisas pelas quais Donald Trump merece crédito, mas a regra dos dois por cento da NATO é uma delas. Todos os países devem gastar pelo menos dois por cento do seu PIB em defesa, para que tenhamos capacidades credíveis, já que vivemos ao lado da Rússia.
E a crer no abrangente kit de ferramentas de defesa finlandês, a segurança é um conceito amplo. No ano passado, apercebemo-nos do que significa a dependência energética.
Depender de combustíveis fósseis e de recursos que estão nas mãos de ditadores autoritários conduz a dependências que podem ser catastróficas. Não podemos fechar os olhos aos défices democráticos quando lidamos com países e devemos ter uma visão crítica das nossas dependências em geral.
E como os incêndios florestais deste verão nos têm mostrado uma e outra vez, a segurança é também uma questão ambiental. Um mundo em que as alterações climáticas grassam não é seguro para ninguém. Mas isto seria tema para outra conversa.
Obrigado por me ouvirem e tenho todo o gosto em responder a quaisquer questões que me queiram colocar.